Projeto desenvolvido pelo grupo Buraco d`Oráculo nas Cohab`s da Zola Leste de São Paulo. Consiste na criação de um circuito de teatro de rua e a criação de três núcleos de teatro de rua que integrará o circuito. Haverá ainda encontros bimestrais com fazedores e pensadores do teatro, denominados Café Teatral e uma publicação intitulada A Gargalhada. Este projeto tem o patrocínio da Lei 13.279/02 - Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo.

Wednesday, December 06, 2006

Uma Introdução a Estética do Grotesco



Desde sua formação o Buraco d`Oráculo trabalha com um gênero específico: a farsa. Não foi uma escolha consciente, pensada. Os espetáculos nos arrastou para esse gênero teatral, que tem uma estrutura simples e absurda. Na farsa ocorre um desmascaramento constante e o corpo assume uma importância fundamental. No nosso caso, um corpo disforme e estranho. Juntamente com a farsa uma estética veio a reboque: o grotesco. O corpo grotesco está presente em todos os nossos espetáculos.
O termo grotesco vem de gruta (em italiano grota), por causa das descobertas, no século XV, de uns ornamentos ‘esquisitos’ retirados de escavações em frente ao Coliseu. O termo sofreu variações ao longo dos tempos. Inicialmente era apenas um substantivo, adjetivou-se e chegou a categoria estética. Esteticamente o grotesco sempre existiu e sempre esteve presente nas manifestações artística desde a Antiguidade, antes mesmo da invenção do termo.

Victor Hugo foi quem elevou o grotesco a categoria estética, ao defender, no prefácio de Cromwell, a mistura do sublime com o grotesco. Mas o que vem a ser uma categoria estética? Segundo Muniz Sodré, “a categoria responde tanto pela produção e estrutura da obra quanto pela ambiência afetiva do espectador, na qual se desenvolve o gosto, na acepção da faculdade de julgar ou apreciar objetos, aparências e comportamentos.” (2002, p.34) Para tanto, necessita de uma organização dos elementos na criação do artista.” (idem, p. 32)
O grotesco opera por rebaixamento, “suscitando (...) riso, horror, espanto, repulsa” (2002, p. 17) e está presente no teatro, na literatura, nas artes plásticas etc. No dizer de Sodré, “o grotesco é o belo de cabeça para baixo.” (p. 28)
Ainda segundo este autor, uma categoria estética tem três planos – criação, componentes e efeitos de gosto – e quatro elementos: equilíbrio de forças, reação afetiva (do espectador perante a obra), valor estético (julgamento) e trânsito estético (“o grotesco pode acontecer numa pintura, num romance, num filme, na vida real e assim por diante.”) (p. 35)
Mikhail Bakhtin afirma que para entender o grotesco é necessário um mergulho na cultura popular, que para ele é pouco estudado. Estudando a cultura popular medieval e renascentista, ele denominou essa estética de realismo grotesco, que tem sua expressão máxima no carnaval, que seria “a segunda vida do povo, baseada no princípio do riso. É a sua vida festiva. (1987, p.7) Essa segunda vida se construiria como “paródia da vida ordinária.” (p. 10) O riso carnavalesco é um patrimônio popular, universal e ambivalente.
“O traço marcante do realismo grotesco é o rebaixamento” (p. 17), ou seja, faz descer a terra tudo que é elevado. O riso grotesco, segundo Bakhtin, nos libertaria das “idéias dominantes. Ao penetrar nesse mundo sentimos uma alegria espacial e ‘licenciosa’ do pensamento e da imaginação.” (p. 43)
O grotesco está associado “a escatologia, a teratologia, aos excessos corporais, às atitudes ridículas e (...) a toda manifestação da paródia em que se produza uma tensão risível, por efeito de um rebaixamento de valores.” (SODRÉ, 2002, p. 62) O fenômeno grotesco manifesta-se, ainda segundo Sodré, representado ou atuado. Sendo que o representado pode está no suporte escrito (literatura, imprensa) e imagístico (pintura, fotografia, cinema televisão etc.). No atuado o fenômeno pode ser espontâneo (“incidentes da vida cotidiana”), encenado (teatro) e carnavalesco (associado às festas e aos espetáculos circenses).
Atuado ou representado o grotesco assume “modalidades expressivas”: escatológico, teratológico, chocante (misto das anteriores, visa apenas chocar) e crítico. Este último propicia um desmascaramento das convenções, rebaixando pelo riso os cânones e o “poder absoluto.” A crítica é lúcida, cruel e risível.
É justamente o grotesco crítico que o Buraco d`Oráculo tem trabalhado em seus espetáculos, rebaixando e desmascarando alguns tipos sociais, fazendo com que o espectador desvende através dessa operação outros valores e encontre, no dizer de Bakhtin, o “seu corpo social.”

Adailton Alves – ator do Buraco d`Oráculo

Bibliografia
BAKHTIN, Mikhail. A Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais. Trad.: Yara Frateschi Vieira. São Paulo: HUCITEC, 1987.

SODRÉ, Muniz; PAIVA, Raquel. O Império do Grotesco. Rio de Janeiro: Mauad, 2002.

3 Comments:

Blogger Unknown said...

parabéns muito boa expicação

12:44 PM

 
Blogger Iggy said...

Muito esclarecedor! valeu!

6:20 PM

 
Blogger Iggy said...

Muito esclarecedor! valeu!

6:20 PM

 

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